Vamos tratar de um tema muito atual e, da mesma
forma, bastante controverso. De início deixo claro que minha opinião é fundada
na condição de cidadão e também bacharel em direito com grande viés
constitucionalista. Considero-me um advogado em potencial, porquanto sou
habilitado pela OAB e apenas não exerço por impedimento legal derivado do
exercício da função de Oficial de Justiça Avaliador.
Feitas as considerações iniciais, fundamentais para
que o leitor entenda meu posicionamento em relação ao tema a ser tratado, vamos
dar início às considerações.
A
prestação de serviço público envolve um conjunto de escolhas da administração,
sendo que o poder executivo, no processo eleitoral, constrói sua legitimidade
política.
A
partir desse momento, são definidas as políticas públicas prioritárias, ou
seja, onde e como gastar o dinheiro público, isso, é claro, considerando os
limites orçamentários reais.
CRFB garante: saúde, moradia, educação e
segurança
A Constituição
da República Federativa do Brasil (CRFB) garante: saúde, moradia, educação e
segurança, apontando para um futuro. Esses artigos garantidores de tais
direitos por muito tempo foram simplesmente nomeados de normas programáticas
(que apontavam para o futuro), todavia, o papel da Carta Maior, num país pobre
com população carente não deve retratar a mediocridade do presente, mas sim
apontar caminhos e soluções a serem seguidos para a transformação da realidade.
Desta
forma, afirmações como saúde e educação na CRFB indicavam direitos para
conquistar uma perspectiva, e não uma certeza. Encarado pelo Poder Público como
exercício do poder discricionário. Assim, muitos gestores simplesmente
ignoravam os ditames constitucionais e aplicavam os recursos na contramão das
necessidades mais prementes da população.
No exercício de seu poder
discricionário, o Poder Público tem limites orçamentários
entendendo o que é conveniente e
oportuno propiciar, usando como argumento a Teoria da Reserva do Possível.
Esta teoria diz que o Estado reserva-se
o direito de fazer o que é possível. Limitações
orçamentárias impediriam a compra
de medicamentos e realização de cirurgias de forma gratuita
O Superior
Tribunal de Justiça no Recurso Especial nº 840.782 tem sido utilizado para
garantir aos administrados o acesso a cirurgias, sendo que antes o Poder
Público imaginava que não devia pagar.
STF garante direito à felicidade
Na
mesma direção, o Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 436.996,
julgado em 2006, garantiu para aos administrados vagas na escola. Hoje, o STF
garante inclusive o direito à felicidade, ainda de forma tímida, mas já
sinalizando os desafios que estão por vir (Exemplo de direito à felicidade: na
Suspensão de Tutela Antecipada nº 223/2008, exigiu-se a aquisição de
determinado aparelho e sua viabilização ao uso do administrado para que tivesse
condição mais confortável em razão de suas condições).
Atualmente,
porém, quando o administrado procura o judiciário, baseia no art. 196 da CRFB o
direito que tem acesso amplo à saúde pública e gratuita como um dever do
Estado. Assim é ato vinculado e não discricionário.
Desse
modo, há um impasse onde o poder público alega limite orçamentário e o direito
de escolha das políticas públicas prioritárias e a intensidade de realização,
ao passo que de outro lado o poder judiciário tem negado a utilização da Teoria
da Reserva do Possível.
O Poder
Judiciário nega a Teoria da Reserva do Possível, utilizando-se do Princípio do
Não Retrocesso; afirma que direitos da CRFB devem ser garantidos para todos os
administrados. É a força da Supremacia da Constituição. Os recentes movimentos
e manifestações populares evidenciam mais ainda o descontentamento popular com
as políticas públicas estabelecidas ao longo dos anos e, certamente os atuais e
próximos gestores irão “pagar” essa conta.
O STF
entende que a palavra “dever” dos arts. 196, 205, 208 da CRFB realmente trata-se
de dever, revelando ato vinculado e não ato discricionário. A CRFB não mudou o
que alterou é a forma do STF tratar do assunto.
Considerações finais.
Entendo
que a judicialização das políticas públicas é positiva em sentido amplo e
geral, mas deve se ter muita cautela para não violar o princípio da separação
dos poderes e/ou inviabilizar a governabilidade. A população precisa da
acolhida do judiciário, mas, também é necessário que entendamos a posição dos
gestores. Nesse confronto de forças e valores, ficamos com a posição da defesa
integral dos ditames constitucionais, esta deve ser cumprida a todo o custo,
não pode ser como afirmou Ferdinand Lassale, uma simples folha de papel. É
preciso ser efetiva e propiciar a busca real pela felicidade de todos nós,
fazendo com que as garantias e direitos nela previstos sejam efetivos.
Se eu
pudesse dar um conselho ou dica aos gestores, principalmente, aos Secretários
(principalmente educação e saúde), aos procuradores gerais e prefeitos
municipais, eu diria que buscassem se antecipar às decisões judiciais,
remanejando verbas para atendimento prioritário à saúde e educação.
Tenho
visto em Leopoldina um grande esforço nesse sentido, e estou otimista quanto ao
futuro a médio e longo prazo, mas é preciso ficar atento a setores que ficam na
sombra, dão prejuízo aos cofres públicos, gastam mal, enfim, não fazem o “dever
de casa”.
(*)Bacharel
em Direito pela Faculdade Doctum, Habilitado
pela OAB/MG; Especialista em
Direito Público pela Universidade Cândido Mendes/Plenarius;
Extensionista no curso LFG, Oficial de Justiça Avaliador do TJMG; Eletrotécnico
formado pelo Cefet-MG; e colunista do GLN.